segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Relicário 2012


Acho que hoje é o dia de fazer o Relicário desse ano.

Por quê? Bem, porque me emocionei com um programa de TV (o relato de um ex presidiário e atual professor da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo) e porque relembrei uma preciosidade em minha vida (dona Ellen).

O ano não foi fácil, mas está terminando incrivelmente bem encaminhado. Devem ser as forças que vieram a somar, para que o barco não vire, para que a força não me abandone. Pensei em desistir, me senti só, mas tudo se organizou com o tempo. Em poucos meses tudo estava programado e tive os apoios necessários para suportar (embora não sem dor), as quedas.

Quando fui à Festa do Livro da USP esse ano senti aquela saudade da graduação em Ciências Humanas. Não adianta, minha pele se arrepia ao ler o texto histórico e social ainda. A gana pela mudança da sociedade, pelo acalentar do próximo, está à frente das minhas expectativas de vida.

Em 2013 o Cursinho tem um lugar novo, somente a acertar seus últimos detalhes. Abriremos também sala para EJA – Educação de Jovens e Adultos, e isso representa um grande avanço para nós. Lidar com pessoas inseridas no mercado de trabalho, com experiências diversas promete ser muito produtivo. Não tenho dúvidas de que será. Desejo que recebamos novamente uma boa leva de buonna gente, que me traga felicidade ao recordar e que faça o melhor possível no mundo.
Espero que eles não esqueçam suas referências iniciais. Que produzam Conhecimento, que façam valer sua história e a honre em seus atos.

Não sei se tenho muito a falar hoje, mas precisava.

Tivemos um ano com muitas pessoas novas, e que vieram para somar. Desejo com todo o meu coração que os estudantes desse ano conquistem a tão-sonhada-idolatrada-salve-salve vaga na universidade.

Realizamos um projeto esse ano, através do Programa VAI, que incluía visitas e saraus às comunidades tradicionais indígena, quilombola e MST. Foi muito produtivo, motivador e transformador para muitos envolvidos. No dia da apresentação final um grupo de estudantes do cursinho prestou uma homenagem aos educadores, através de um vídeo com depoimentos, músicas, imagens... enfim, a trajetória do ano. Fiquei muito emocionada, naquele momento percebi o quanto o ano tinha fechado o ciclo. Quase me acabei em lágrimas (sempre contidas) quando a Eduarda falou e se emocionou, falou um pouco sobre ela estar no Mafalda, e o quanto o projeto representa na vida dela. Isso vale muito a pena! Vocês não fazem ideia!

Foi um ano de amadurecimento também. A Gabrielle está crescendo socialmente, estou aprendendo com ela. Estamos trocando. Nunca poderei dimensionar a ela o quanto sou grata por ela me permitir falar e ter quem ouça. Hoje, por sinal, comemoramos mais um mês, ao longo desses 2 anos e tantos, de infinito amor e companheirismo. De aprendizado e de cativação mútua. Alguns problemas de ordem familiar, alguma feridas ainda abertas, injustiças, sobretudo. Mas seguimos, como faríamos se não fosse assim? O importante é viver. Tem alguma dúvida?

Desejo que no próximo ano possamos ser pessoas melhores para o mundo. Desejo isso todo ano, fruto da inspiração de Dona Mafalda, parece uma repetição vazia para os de fora, os que estão dentro sabem o quanto lutamos juntos por isso. Espero que consigamos.

“É só o amor que conhece o que é verdade...” (Legião Urbana)

terça-feira, 10 de abril de 2012

Sobre suas aulas e a vida

Professora Bete (falo com o professora na frente por considerar você uma referência no que faz),

hoje pude, enfim, assistir ao filme "O Contador de Histórias". Sabe qual é? Conta a história do Roberto, aquele contador de histórias que conheci na Sala de Leitura da EMEF Gal. Othelo Franco, em uma daquelas manhãs e tardes tão cheias de história, notícias, reflexões, cheias de aprendizado.

Não pude me conter, precisei enviar este e-mail. E a quem? A quem foi mais que professora.

E o que era aquela Sala de Leitura? Que lugar mágico. Foi o lugar da minha primeira leitura, não me lembro o nome do livro, mas me lembro um pouco da história... uma mãe com sete filhos, um chamado segunda-feira, o outro terça-feira, o outro quarta, e assim por diante, até que se completassem todos os dias da semana. Deve saber qual é, sim?

Minha presença no Othelo foi tomando forma desde que entrei. Era atenciosa com as coisas, tinha em mim algo grande. Queria ser professora - ainda quero, sou aos sábados.
Lembro de alguns momentos complicados, da noite que cheguei em casa triste e dormi chorando por ter ouvido algumas palavras de uma senhora, se dirigindo a um colega de classe, morador do mesmo bairro que eu: "Ou você vai melhorar, ou vai voltar para o buraco de onde veio". A senhora, Dona Sandra, referia-se neste trecho ao meu bairro. Cidade Tiradentes. Chorei uma dor sentida, por que eu morava em um "buraco"? Por que o meu bairro era ruim? Minha mãe mora aqui, eu cresci aqui, fui boa aluna aqui e frequentei meu primeiro dia de aula aqui. Não, não era ruim, aquela Dona não sabia de nada. Não sabia, sobretudo, que palavras tinham poder.

Anos depois tive de ouvir, de alguém que não pude retrucar no momento, que a polícia devia mesmo entrar na favela e matar todo mundo. Como matar todo mundo? Quem era aquela pessoa que se dizia espírita e fraterna? Eu, minha mãe, minha avó, minha bisavó e meu irmão, nós somos periféricos. Ouvir aquilo foi uma das piores coisas que já entraram por meus ouvidos. Soube que não pertencia àquele ambiente que estava quase me embalando. Não poderia pertencer a um local onde os que reinam desejam o extermínio, pela polícia, de seres humanos.

Por que a sociedade é tão injusta? Por que minha mãe tinha de se humilhar para acompanhar uma premiação da filha que, na oitava série, escreveu, sem ajuda ou auxílio de nenhum professor, uma redação que foi eleita uma das dez melhores do estado de São Paulo? E lembra quem eu chamei para acompanhar aquele momento que não poderia ter ao meu lado a mulher que sempre foi minha inspiração de coragem e luta? A senhora, professora. E por quê? Porque sentia que podia confiar, mas não foi uma atitude fácil, foi dolorido ouvir de minha mãe que a patroa não a tinha autorizado e que a premiação era bem no horário de "pico" do restaurante em que trabalhava.
Por fim, ela pôde ir. E a senhora e a professora Eloísa e a professora Dagmar também. Ganhei uma rosa da professora Dagmar, era o símbolo do reconhecimento. Ela se atrasou no dia, achei que não viria mais, ela se atrasou por não ter encontrado nenhum lugar aberto para comprar a rosa, faltou ao trabalho na outra escola em que lecionava para acompanhar-me.
Minha mãe estava linda aquele dia, com uma roupa social que eu gostava muito que ela usasse, tinha cor amarronzada. Ficou tão orgulhosa e eu tão feliz por ter dado aquele momento a ela.

Voltando ao filme, quando ela acaba, a cena é da mãe do contador de histórias lavando roupas em um tanque, e ele chegando... a pergunta dela: "Disseram que você só sairia da FEBEM doutor, e o que é que você se tornou, meu filho?", e ele dá-lhe a resposta: "Professor, mãe".
E então, senti dolorida novamente a humildade do coração daquela mãe, que tinha legado ao filho o destino que ela, por esperança, deixou cair sobre o colo do Estado. E coitado dele se tivesse dependido do sistema falido do Estado.
Percebi então um ponto semelhante entre a biografia dele e a minha, a esperança de nossas mães. A esperança em um futuro melhor, menos feroz do que elas enfrentam - ou são obrigadas a enfrentar - para levar uma casa, filhos, gastos com alimentação, transporte, estudo, serem respeitadas, suportarem firme.

Lembro de uma coordenadora que tivemos no Othelo, e um dia que tivemos uma peça na escola. Só poderia ver a peça os alunos que pagaram, era do grupo Café&Poesia, se não me engano. Eu não tinha levado o dinheiro, tinha esquecido de pedir pra minha mãe. Estava dentro da sala, junto de outra meia dúzia de alunos que não pagaram. A coordenadora veio até a porta e me viu, espantou-se, pediu que eu saísse da sala e a acompanhasse, fui com ela até a secretaria e ela me disse: "Você trabalha demais por essa escola (na época eu já era do Grêmio), não é justo ficar sem ver a peça. Tome este ingresso, leve lá embaixo", tentei dizer que não precisava, mas não consegui expor direito o que queria, tamanha minha felicidade, cheguei no pátio com a peça quase no começo e com os olhos cheios d'água.

Outras duas vezes que senti muita alegria foi quando a professora Eloísa me deu uma caixa inteira de lápis Faber-Castell, aquelas com muitas cores, acho que 34 ou 36 cores, ela tinha visto meus desenhos e a condição de meus lápis (pequenos, no toco) uns dias antes, e eu tinha dito que eles estavam quase acabando e que eu só gostava de pintar com lápis Faber-Castell. Mas como sabe, eles são caros, não seria justo pedir a minha mãe que os comprasse. Ela me chamou no meio de uma aula e me entregou a caixa, disse: "Olha, são da minha filha, ela mau usa, trouxe pra você". Naquele dia fiquei perplexa com a atitude, com o carinho. Chorei. E nunca me esqueci disso. Fazia desenhos muito coloridos, dizia que queria colocar a cor que minha vida não tinha, estava em um quadro depressivo e não sabia, vim saber anos depois.

A outra ocasião foi quando a professora Estelita, de Matemática, convocou alguns alunos para uma conversa na sala dos professores, eu estava entre os poucos. Não sabíamos do que se tratava, mas soubemos assim que chegamos. Era um convite para participar das Olimpíadas de Matemática, ela tinha chamado somente os melhores alunos. Voltei para a sala, onde estava passando lição na lousa, para os outros copiarem (não me lembro se por falta de professor ou para ajudar algum); enquanto escrevia a lição na lousa, chorava discretamente. Feliz novamente.

Sabia que alguns professores não acreditavam em mim, eu era "bocuda", falava gírias com frequência, nada mais normal no frenesi da pré-adolescência, não? Mas algumas pessoas eram desonestas, lembro quando uma professora me contou que tudo o que eu falava para a Dona R. era repassado aos professores na Sala dos Professores. Fiquei com muita raiva naquele dia, quis sair da sala, mas não saí porque fui proibida pela professora que tinha me contado, ela sim, digna.

Eu sempre gostei muito de Geografia, foi então que em uma aula da Nelci fiquei mais agitada, devo ter respondido para ela. Entretanto, nenhuma atitude de represália pública foi tomada. No fim do período ela me chamou para sentar em frente à mesa dela e perguntou o que estava acontecendo... Como ela podia saber que tinha algo errado comigo? Não sei porque, mas comecei a chorar e a contar fatos sobre minha vida. Aos 11, 12, 13 anos eu já sentia muito peso nas costas. Acho que foi isso que me fez desabar. Ela partilhou comigo alguns traços autobiográficos, das dificuldades que a família dela tinha e como ela tinha se tornado professora. Foi uma inspiração.

Anos depois, quando estava na EE Oswaldo Catalano, conversando com a diretora Mariangélica sobre o cursinho que tinha acabado de ser implantado acompanhando a Priscilla (ex-coordenadora), ouvi novamente coisas que me deixaram mexidas, a diretora dizia que ela tinha problemas com os professores da escola, que não gostavam dos alunos daquela escola, porque eles vinham de Guaianases, Itaim Paulista, Cidade Tiradentes, diziam que a escola era ruim porque ela não fazia como o Ascendino, de selecionar os alunos pela localidade da casa, que aceitava um monte de marginais... e para completar ela contou que a fila para matrícula daquele ano tinha extensão do portão da escola até a Av. Celso Garcia, que muitas mães tinham dormido na porta para conseguir vaga. Pedi licença para ir ao banheiro, chorei mais uma vez, sentia todas aquelas palavras, sabia o que era este tipo de preconceito. Tentei me recompor e voltar à sala dela, e não mais pensar naquelas coisas, correndo o risco de chorar na frente de todos dessa vez.

Sempre era a mesma história... quantos dos meus amigos, que estudaram comigo no Othelo deram "certo"? Poucos, acho que se eu contar em uma mão, sobrarão muitos dedos. E por quê? Ora, não é óbvio? Olha bem o sistema econômico e social em que vivemos, as pessoas são praticamente obrigadas a viver uma vida de privações, obrigações e nenhum lazer, nenhuma felicidade concreta e verdadeira. Só distração barata, sem conteúdo ou qualidade.
Como esperar que as pessoas mudem se o mundo continua o mesmo - ou cada vez pior - cada vez mais virulento? Como querer que as crianças queiram aprender algo e tenham interesse pela escola, quando ela é totalmente avessa às suas reais condições de vida?

Por que me dedico tanto ao cursinho que coordeno? Porque não quero ser mais exceção, quero que mais pessoas, como eu, possam ter os horizontes ampliados, consciência para perceber o mundo e atuar nele. Quero oferecer mais ferramentas como as que tive naquela Sala de Leitura. Enquanto o conhecimento, que gera sabedoria sensível, não for fomentado não teremos mais exceções, teremos só regras, as regras da operadoras de Telemarketing, as regras da caixas de supermercado, das atendentes do McDonald's. Continuaremos, então, a produzir uma sociedade da qual somos co-autores, que forma seres humanos incompletos, incompreendidos e incapazes de compreender.
Enquanto a empatia não for a moeda-chave da vida, e a fraternidade e solidariedade guiar nossos passos, teremos mais e mais estudantes que entram na escola, sentam nos bancos que eu sentei um dia e saem para assaltar bancos.

Espero que meu relato sirva para saber como minha vida tomou rumos diferentes dos que poderia ter tomado, não fosse a família que tenho e as mestras que tive ao longo do caminho. Que renove sua felicidade ao lecionar, estou contigo.


Fraternalmente,

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

O texto do ano.

Comecei a pensar mais profundamente hoje sobre vários fatos desse ano, sobre meus conflitos internos, tudo o que tem por vir, o que conquistei e o que ainda preciso conquistar. Minhas aspirações, as realizações... enfim, vamos lá: dar forma aos pensamentos.
Primeira coisa: acho muito chato esse negócio de inferno astral. Se ele existe ou não eu não sei, mas fim de ano pra mim é quase que um aniversário-sem-fim. Quem me conhece sabe o quanto eu não gosto de fazer aniversário. Não acho que seja pela idade, mas são ciclos, e os ciclos parecem continuamente intermináveis, constantemente necessitantes de mais tempo, de um pouco mais de tempo para se fechar. Ele se fecha sem que estejamos prontos, esta é a verdade.
Fazer a avaliação de um ano, estando ainda nele é difícil, uma tarefa desonesta. Pois como todos devem supor, é melhor falar das coisas quando você já passou por ela e fez uma reflexão mais prolongada, entretanto a 'tradição' que inventei (não é mesmo, Hobs?) de escrever meu texto de reflexão nos últimos dias do ano me chamam a fazê-lo.
Entrei na faculdade, já adiantei no último post os motivos e como foi o ingresso. Entretanto a estadia está sendo infernal. Não fosse pela minha turma ser legal (claro que não são estudantes de Ciências Sociais ou História, são alunos de Medicina) as coisas estariam mais difíceis. Tem uma ou outra 'maçã podre' no meio, mas são tão poucos, ou me afasto deles com tanta veemência, que praticamente não os noto. Surpreendi-me muito com minha turma, esperava o pior, e me vieram pessoas deliciosas de se conviver - claro, com aqueles problemas comuns a todos os que não fazem uma reflexão mais profunda da sociedade (o que me rendeu um choro compulsivo no meio de uma aula/tutoria depois de todos concordarem que uma mulher que sai na rua com roupas curtas tem parte da responsabilidade por ser estuprada. Esse dia foi o campeão em distanciamento, ali percebi o quanto eu era diferente de todos eles. Obviamente não dá pra exigir das pessoas formações que elas não tiveram, reflexões que não foram estimuladas a ter. Ficou por isso mesmo.).
[A PARTE QUE ESTAVA AQUI FOI CENSURADA, não dizia respeito a nada muito importante]
Seria errado dizer que o segundo semestre foi ruim, porque não foi. Tive, em contrapartida a tudo o que foi acontecendo, o cursinho. Foi um ano excelente, pessoas e vidas maravilhosas. Um exercício de amor a cada semana, a cada contato. Aprendi muito, me aproximei de muitos estudantes, tive marcas em meu coração que ficarão para sempre: deixei parte de meu coração com cada um deles, recebi em troca outra parte, um carinho, um abraço, um desejo sincero, uma gratidão que é recíproca, sem eles eu não teria crescido como cresci.
Fui levada a me envolver com histórias complicadas e pessoas incríveis, pessoas fortes. Tive uma companhia inseparável nesses momentos, a Gabrielle. Ela contribuiu para que eu não caísse, para que não pendesse para um lado, ela tem uma profunda sensibilidade que foi vital nos momentos em que passamos.
No dia dos professores alguns estudantes programaram uma intervenção na escola, colocaram post-it com recados, frases, em homenagem aos educadores. Foi um ato de tanta beleza, foi reconhecimento do trabalho de todos que doaram tempo, amor e fizeram parte de uma rede de solidariedade pela Educação, por sonhos. Saí com um sorriso profundo, não pude pensar em outra coisa durante o dia, a semana, o mês. São incríveis. Todos e todas. Tivemos depois o encontro de fim de ano, ganhei muitos presentes lindos, delicados, com amor. O maior de todos eles, entretanto, foi a convivência com eles durante o ano. Ganhei panos delicadíssimos da Maira, uma bolsa com um tecido com flores rosas lindas do Yuri, um vaso pintado à mão e sementes para florescer da Ellen. Depois ganhei uma agenda de um grupo querido também, da qual batizei 'Cursinho Popular Mafalda', veio da educação, que retorne a ela.
E daí deve estar a pergunta: Ma-fal-da? Li direito? Oi? Sim. Leu. É o novo nome do cursinho; nos separamos da Rede Emancipa, por questões partidárias e por questões pedagógicas conflitantes. Continuamos com um corpo docente grande e firme. Pretendo me reunir com as outras coordenadoras (ah, tivemos uma perda, o Cláudio. Ele saiu da coordenação e do cursinho após muitas discussões sobre os pontos pedagógicos e desvinculação da Rede. Inda vale a amizade. Ela não se foi, e quero que perdure, espero que um dia consigamos nos entender, ele foi uma pedra-chave este ano para o cursinho) e os professores para travar os planos de ensino e estratégias para este ano que se inicia. Quero que ele seja melhor que o ano que passou, espero que consigamos. Esse ano tivemos aprovações em grandes vestibulares, e acredito que a maior parte dos que estudaram conosco conquistem uma vaga no Ensino Superior. Foi um ano que exigiu muito, mas deu muito retorno; então não me sinto super consumida ou em débito.
Comecei também a ter mais contato com a família da Gabi. Há muitos conflitos políticos entre mim e alguns membros da família. Mantenho-me em silêncio na maior parte das vezes, para preservar a boa convivência, para não fazer com que a Gabi fique mal, sinta-se deslocada ou mesmo dividida. Tem coisa que dói, que machuca, que me faz pensar em não voltar nunca pra casa dela, de não falar mais com algumas pessoas. Mas volto, relevo, sofro calada por algumas declarações infundadas. Sabem que sou mesmo sentimental em questões sociais, não tem como não ser. Algumas coisas me incomodam verdadeiramente. Um dia teremos nossa casa, e fim. Teremos nossas filhas, criadas à moda de Zélia Gattai. Chega. Pausa em uma geração reacionária.
Quero conseguir contagiar as pessoas, ajudar, auxiliar, tentar uma transformação; quero ter um papel social atuante, importante para os indivíduos, pois lidar com sociedade em quantidade exige outros termos, outras intenções e outro jogo, que não sei se faz o meu tipo. Prefiro atuar ano-a-ano, no cursinho, no ônibus, na faculdade, no meu meio social. Buscar fazer coisas reais e verdadeiras, não gosto de pessoas que falam muito e não fazem nada... chega de verborragia falsa.
Sobre o cursinho, teve uma pessoa em especial que me fez relembrar Maíra em muitos momentos: a Ellen. Ela é uma pessoa cheia de luz, um encanto, leva amor, compreensão e paz por onde passa. Tem força e sensibilidade. Fez com que eu chorasse, repensasse meus caminhos profissionais, me deu uma ponta de esperança no mundo. Foi importante sem nem ter ideia muitas vezes da dimensão de tudo o que representou na vida dessa jovem senhora.
Em casa os conflitos com minha mãe continuam, eu a amo muito, mas ela é muito chata, rs... toda mãe é assim? Poxa vida, não quero ser uma mãe tão chata. Mas como eu não sou perfeita, como exigir que ela seja também? Meu irmão está cada vez maior, mais lindo, esperto e inteligente. Folgado também, é com muito custo que ele arruma a cama e guarda os brinquedos quando tira-os da mala de brinquedos. Mas ele é um ser humano muito bom, uma pessoa que tem um coração fraterno. Sofre com os coleguinhas, como toda criança, acaba me lembrando eu mesma quando criança. É engraçado isso. Se tem algo que eu desejo com todo o coração é que ele seja uma pessoa boa sempre, quero que ele consiga contribuir para um mundo melhor sendo uma pessoa melhor.
Com a Gabi está tudo bem, ótimo pra falar a verdade. Sabemos do nosso hoje, e empreendemos nossos esforços para o futuro. Quero estar com ela ao meu lado até envelhecer, e que não seja permitido, pela natureza ou por forças energéticas quais sejam, que ela se afaste de mim ou vá antes de mim. Tenho que admitir, queridos, eu amo com todo o meu ser. Sim, tudo o que compõe um ser, eu amo com tudo isso. Tê-la ao meu lado fez o mundo ser melhor, fez o coração se abrir mais, fez as trancas fornecerem a chave-mestra.

Desejo a todos e a todas um futuro melhor, e um ano próximo que seja de ganhos, batalhas e ganhos.
(OBS.: Sei que escrevi menos ou com menor profundidade que de costume, mas volto a falar-lhes as minucies dos casos ao longo do próximo ano).

domingo, 11 de setembro de 2011

O pensar do outro

Escrever e falar sempre confere forma aos pensamentos. É uma espécie de reflexão contínua durante a confecção do texto, as palavras vão se encaixando e fazendo sentido - pelo menos para quem o escreve - afinal de contas, a lógica é variável, ao contrário do que se pode pensar ao ter como referência a matemática escolar tradicional, em que 1+1 é sempre igual a 2. O poeta músico pode encarar como "...um mais um é sempre mais que dois, pra melhor juntar as nossas forças" [O sal da Terra - Roupa Nova]; e mais, aquele dito 'louco', o que não se encaixa na normalidade definida pela maioria, pode achar que dois sequer existe, independente da organização algébrica.
Gosto de pensar que as lógicas existem, que elas são variáveis. E falo de lógica, não de farsa; essa não é uma ode ao falso, ao fingimento, ela é ao pluralismo, às diferenças de pensamentos, de lógicas e de seres. Talvez eu siga algo na área de psiquiatria. Pensar e refletir é um exercício fascinante sempre, exige muito de nós, fato. Exige aceitar e pensar em coisas que, para nós, são pilares da lógica convencional (ou deveria dizer 'social'?). Essa minha paixão pelo pensar do outro [acabei de encontrar o título do texto presente] é devido, em primeira instância, a Antropologia. Eu sempre digo, e muitos riem, quando digo que "A Antropologia mudou a minha vida". Ela mudou o meu modo de pensar as ações dos outros, isso ajuda a me acalmar diante de atitudes que antes ficaria furiosa, infantilmente, claro, porque nós não podemos mudar alguém, não podemos fazer com que ele entenda ou aprenda algo que queremos. Tudo se baseia em troca. Para os mais espiritualizados, eu poderia sugerir um entendimento de antropologia como troca de energia.
Lembro de uma aula, em que defendi a resignificação cultural em oposição à aculturação. E recebi como resposta, da própria professora Maíra, a lembrança de que as trocas se dão por meio de um sistema em que um sempre exerce mais poder sobre o outro. De fato, devo admitir que esse é um ponto indiscutível. Há sempre um que exerce mais influência sobre o outro. Vide a relação entre mídia e a massa populacional. A troca é dada a partir dessas considerações. O psiquiatra tem mais poder que o seu paciente; o professor tem mais poder que os seus alunos; os pais têm mais poder que seus filhos. Mas não há quem não possa se propor a ouvir, compreender e remodelar-se, caso queira. Está aí a graça da coisa, se tornar diferente do que acredita ser, se pôr a questionar a si mesmo, buscar conhecer a si mesmo, do modo mais profundo encontrado: com a contribuição dos outros. A verdadeira Antropologia (para mim) está nisso, é ir além da empatia, é refletir e se permitir mudar, e não adianta esperar que a primeira atitude venha do outro, isso seria condicionar seu próprio crescimento e limitar sua reflexão.

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Novidades.

Hoje lembrei que tenho um blog, normalmente me esqueço dele durante o ano daí quando estamos chegando ao final, invento de escrever sobre as impressões e as novidades do ano. Entretanto, fechei um ciclo em minha vida. Talvez seja hora de abrir uma exceção bem no meio do ano, há poucos dias de iniciar um novo curso e uma nova fase, embora o coração permaneça o mesmo.
Fui ao shopping hoje e vi a Thais, conversamos bastante sobre muitas coisas, foi ótimo reencontrá-la. Ela está bem, fazendo psicologia na Unesp e super feliz com o curso. Por tê-la visto hoje é que lembrei desse blog, reli o último post. Conversei com a Gabi sobre a Adrielle, sobre as conclusões que cheguei hoje, depois da conversa com a Thais... algo ainda me incomoda, talvez eu esqueça, talvez incomode pra sempre, talvez em alguns anos ou segundos tudo desapareça. Quem sabe? Mas não quero me alongar nisso, quero falar da nova fase.

Bem, comecei a lecionar esse ano. Sofri decepções seguidas, sobretudo comigo mesma. Achei que era poderosa, achei que eu podia, achei que seria simples e que seria possível. É muito difícil trabalhar em um sistema falido, sobretudo se você quer fazer as coisas do jeito certo. O dia é desgastante, 78 aulas no mês lhe rendem pouco mais de quinhentos reais, mais desconto de 8%, no Estado. E acreditem, não é por dinheiro, é por falta de perspectiva mesmo - caso fosse o contrário, não seria professora voluntária aos sábados em um projeto que amo verdadeiramente: o Cursinho Popular Paulo Freire.
Aconteceram diversas coisas desde que comecei a lecionar, uma delas, bem marcante, foi a de ter uma crise de choro em sala de aula; depois de um dia cansativo de aula (porque eu me recuso a ser 'eventual' e esquentar banco) e tentando manter ordem na sala para começar, não consegui, não obtive êxito em manter o silêncio básico para se iniciar algo... então pensei "Tudo bem, é o que querem, pois bem". Sentei na cadeira do professor e fiquei sem falar nada por alguns segundos, abri minha bolsa e encontrei uma agenda que comprei do Thiago do PSTU (é uma agenda linda, com diversas figuras e frases interessantes), comecei a folhear e encontrei uma série de dados que havia escrito para uma palestra sobre Cotas Raciais, pois fui fazer uma palestra no Cursinho Popular Patrícia Galvão - da mesma rede - para explicar os benefícios das cotas nos vestibulares e a intenção delas. Quando comecei a reler esses dados me senti mal. Senti que estava traindo os alunos, à medida que sentava e não dava aula, mesmo sendo paga pelo Estado naquele momento para lecionar; traindo o próprio Estado, que e bancado pela grande massa popular; traindo a mim mesma, que tive a mesma trajetória de muitos alunos sentados naqueles bancos, que eram mal vistos pelos professores por serem da periferia e quererem estudar em um bairro neo rico. Levantei, comecei a escrever alguns daqueles dados - muito bem cabidos, por sinal, já que eu estava em uma sala com maioria negra e afrodescendente. Depois me sentei em cima da carteira do professor, e não consegui falar mais que meia dúzia de palavras antes de desabar em choro ao lembrar o esforço que minha mãe sempre fez para que eu estudasse, em me manter longe, pagar passagem, acreditar em mim - que, querendo ou não, carregava as expectativas dela de uma vida melhor - em relação aos estudos, em lembrar que sou afrodescendente e periférica, que sou, assumidamente e orgulhosa de sê-lo! Chorei e falei, falei e chorei... não sei se as coisas ficaram claras para eles, não sei se eles me entenderam, não sei se fiz certo, não sei se errei drasticamente... Mas não soube ser profissional nesse momento, não soube separar meu trabalho, minha frustração e minha vida pessoal. Sempre trabalhei com o coração, sempre quis a verdade e quis sentir o sangue correndo nas veias com cabeça em pé e sensação de dever cumprido.
Não consegui voltar à escola muitas outras vezes depois desse episódio. Fiquei decepcionada, sobretudo comigo. E desestimulada ao perceber a falência múltipla de órgãos da escola pública. Eu, justo eu... eu que sempre sonhei - sim, sempre foi um sonho - ser professora, alcançar os alunos, conseguir trazê-los para a aula, para navegar comigo (sim, as aulas são navegações de ideias e de experiências). Outra vez, quando estava cobrindo uma professora de português - que estava de licença - eu fui desrespeitada em minha última aula do dia. Era no período noturno, fiquei pensando o que estava fazendo ali, próximo às 23h, tentando conduzir uma aula de Literatura para 3º ano do Ensino Médio... Não fui mais.
Comecei a trabalhar em um colégio particular, pouca coisa mudou. Muitos alunos arrogantes, muita falta de vontade - que, na verdade, é geral - mas ao mesmo tempo uma sala agradável, o 3º ano do Ensino Médio regular. Adorei trabalhar lá, o pessoal era bem legal e mais maduro, consegui ser professora de Geografia, consegui desenvolver discussões, consegui sentar em círculo. Senti-me realizada por diversas vezes por lá.
Sofro também por amar a Maíra, por ter nela um exemplo, uma espécie de guia, por ela nunca ter sabido exatamente tudo o que sinto por ela, admiro a Maíra mais que a qualquer outro professor ou esquerdista que tenha conhecido. Uma vez ela disse que os alunos - quando pequenos - se apaixonam pela professora, acham que a professora é perfeita, por isso sempre querem sentar perto, querem atenção, querem conversar. Sim, fui assim e nem ao menos fui boa aluna o suficiente para conseguir receber um elogio ou fui covarde e medrosa o suficiente para conseguir me achegar mais. Aquela senhora de meia-idade, atéia e rabugenta - como ela mesma se descreve - tem amor de sobra, palavras doces, memórias revolucionárias, personalidade forte e postura. Uma das índoles mais limpas que já conheci, alguém com verdade e ternura no olhar. Mudei muito com suas aulas. E mudei calada. Chorei diversas vezes após - ou durante - as aulas, pois o amor que emprega nas palavras a fazem transformadoras. E, afinal de contas, sempre fui um pouco diferente da maioria das pessoas. Sou durona sim, mas tenho o coração mole, acho que quase como manteiga... Quando se trata de sociedade, sofrimento, dor e revolução, sempre fico extremamente mexida. "Queria viver de ideologia", sempre quis. Por isso a opção por História e Ciências Sociais, por isso a opção por acreditar, por me doar, por não largar o cursinho, mesmo nas piores épocas financeiras.

Ainda sinto o arrepio por todo o meu corpo ao ler um texto de História. Soube que queria História depois que me toquei disso, que, meu amor pelo estudo da História chegava a ser físico, tamanha influência tinha sobre mim.
Ainda amo inenarravelmente sociologia, ciência política e antropologia. Consigo perceber minha mudança ao ler aqueles textos, minhas reflexões.
Sempre quis fazer com amor, com o coração. Afinal, fui movida a fazer esses dois cursos pelo imenso amor que sinto pelo mundo, pelas pessoas, e sobretudo pela Educação. Por acreditar que é ela, e não qualquer outra, a responsável pelo desenvolvimento, emancipação e humanização do ser humano. Não deixei de acreditar na Educação nem em sua força, mas resolvi não embarcar no ensino público como ele está. Enfim, percebi que nem sempre podemos chegar ao que queremos diretamente, às vezes é necessário passar por outras coisas para chegar onde se almeja. Foi essa a minha decisão quando parei de ir aos cursos.

Tive duas crises 'homéricas' de choro. Uma foi o último dia em que fui à Unifesp, na volta pra casa. Outra foi esses dias atrás. Chorei por ter que sair, por ter concordado que não dava pra se fazer muita coisa lá dentro ainda, chorei por ter passado a vida inteira na escola pública e quando voltei, não pude fazer tudo o que desejava. Chorei por vergonha ao largar assim, de repente, por ter de largar meus amigos diários, por tudo. Mas chorei mesmo, chorei muito... não conseguia falar, minha voz saía trêmula ao tentar explicar, as lágrimas caiam compulsivamente como um rio que corre veloz, me senti mal, e tive medo, sobretudo medo: medo de fazer aquilo por algum outro motivo que não me desse, necessariamente, um retorno vigoroso à Educação. E foi nesses dois momentos que não quis trair minha história, minha própria vida, meus princípios. Talvez ninguém entenda, talvez entendam, mas eu sou alguém que considera totalmente sua história pessoal, que vive em prol daquilo em que acredita. Pode ser besteira, infantilidade, ou qualquer outra coisa, até inocência, mas amo as pessoas, quero e vou fazer algo. É por isso que vou para a Medicina, com os olhos na Educação, não podia ser diferente. Sou um ser social, socialmente ativo, com sede de verdade, com uma armadura de braveza e prudência, quando, na verdade, me dou totalmente e acredito em tudo.

Sim, fui contemplada com uma bolsa integral em Medicina na Universidade Cidade de São Paulo. Tenho seis longos anos pela frente. Trilharei esse caminho com olhos no futuro. Quero ser uma boa médica - o melhor que eu puder. Quero conseguir trabalhar e também ter dinheiro para montar uma escola. Afinal, foi o que eu sempre quis. Espero mudar, amadurecer, crescer, adquirir sabedoria ao lidar com as pessoas. No final das contas, não me interessa o status dentro da medicina, não é o meu foco... só quero trabalhar direito e conseguir um salário bom o suficiente, para que, depois de uns 15 ou 20 anos de formada, consiga começar a pensar em fazer outro curso e planejar minha escola. Talvez eu possa colaborar para uma geração de médicos mais 'humanos'. Pois é, acreditem, é isso que se busca em muitas universidades.

Talvez eu tenha errado, talvez eu tenha acertado. Talvez eu tenha amadurecido, talvez não. Não sei, não acho que posso concluir essa 'parte' da minha vida ainda. Vou esperar, fazer tudo que for possível e realizar.



Talita Amaro

domingo, 26 de dezembro de 2010

Relicário 2010

Hoje resolvi escrever o Relicário de 2010. Contudo, alguns temas antigos serão retomados. Agora, e só agora, me sinto confortável pra falar de algumas coisas.

Uma dessas coisas é o meu Ensino Médio. Ontem estava ouvindo um CD de MP3, devia ter cerca de 100 músicas, a maioria samba, mas tinham algumas músicas internacionais, dentre elas Photograph do Nickelback. Foi essa a música que eu escolhi pra fazer o vídeo de homenagem para minha turma, que me acompanhou durante três anos e foi de fundamental importância para o meu desenvolvimento. Lembro do dia que combinamos a ‘festinha’ no Extra, que era bem próximo à escola, e eu pedi aos funcionários do supermercado para colocar o vídeo na cadeia de microcomputadores da loja. Então chamei metade deles, e depois a outra metade, e todos assistiram, juntos, ao vídeo que passava simultaneamente em todos os microcomputadores do setor. Foi um momento bastante confuso pra mim. Uma mistura de sentimentos. Eu estava muito triste naquele fim de ano. Muita coisa desagradável tinha acontecido, mas desde a oitava série, em que eu optei por não participar da formatura e me arrependi, prometi a mim mesma que não deixaria de fazer as coisas da escola, não deixaria de participar de momentos de confraternização independente da minha situação emocional no momento.
Portanto fiz. A Adrielle não estava presente, ela não tinha ido esse dia para a festinha no Extra. E a música, a tão bem escolhida música tinha me sido apresentada por ela. Ela, que foi a pessoa com quem eu mais tive afinidade no Ensino Médio, não estava presente pra ver o vídeo que eu tinha feito em homenagem pra toda a sala, e a música, ela saberia que era especialmente escolhida por causa dela. Enfim, ela viu no dia da comemoração de todos os terceiros anos, – em que eu estava hiper preocupada pra saber se ela viria, pois já estava quase na hora da apresentação da minha sala e iam passar meu vídeo e ela não veria, pela segunda vez perdida. Desci as escadas encaracoladas com a maior rapidez pra ver se ela chegava, então a encontrei, não lembro se na escada ou na entrada, mas subimos juntas e o vídeo estava começando. – no evento que a escola realizava e que cada sala apresentava alguma coisa que tinha bolado. Algumas fizeram teatro, outras vídeos, outras cantaram, outras fizeram todas as coisas. Além das premiações de ‘o mais nerd’, ‘o casal mais bonito’, ‘o menino / a menina mais bonito (a) da escola’, dentre outras categorias.
Eu não pude sentir nada naqueles últimos meses. Tudo era tão confuso. A Gabriela tinha saído da escola por ela ter dito à mãe dela sobre tudo o que aconteceu, o pai dela - soube depois – bateu nela, ela ficou presa em casa durante um tempo e eu fiquei na escola. Naquela Sala do Grêmio. Onde tudo me lembrava as conquistas do ano, lembrava as promessas ditas lá, a cor de tudo, o armário, a organização. Toda a organização tinha sido feito em dupla praticamente. A Sala representava o status que eu havia adquirido na escola também. Eu era então a presidente do Grêmio. Foi em frente a esta sala também que encarei um dos piores momentos da minha vida institucional. Devido a uma determinação minha no Campeonato Esportivo da escola, quase todos os membros do Grêmio vieram falar comigo, dizendo que eu não mandava sozinha no Grêmio. Acharia digno isso, muito, inclusive. Caso todos participassem das reuniões, caso todos fizessem algo. Lembro do Paulo dizendo “Mas você não deixa a gente fazer nada” e então, a pergunta trivial: “O que você propôs que eu disse não?”, como resposta, o vácuo.
Sempre fui muito determinada em tudo que me propus a fazer. Foi a gota d’água aquilo. Depois de tudo! Depois de todos os problemas que o ano se encarregou de me trazer, pra finalizar com ‘chave de ouro’ eis que o grupo que fiz parte, e que se absteve em diversas determinações, resolve se pôr contra mim. Excelente. Aceitei a decisão da ‘maioria’, e então foi feito o que eles queriam. Era só isso que queriam? Então está feito. Parabéns, vocês conseguiram se reunir pra resolver alguma coisa, mesmo não estando por dentro do que tinha acontecido de fato.
Eis que se deu a desdita. O desânimo já impulsionado se tornou ainda maior. Tinha um certo desgosto de ir à escola. Não me lembro quem, mas depois de eu ter contado o ocorrido a um integrante do Grêmio que não estava presente nessa ‘reunião’, me disse (na verdade acho que foi o Elvis, mas seria injusto afirmar algo que é tão nebuloso em minha memória): “Não acredito. Posso até não concordar com você, mas não tenho moral pra exigir nada, você que levou o Grêmio à frente o ano todo. O que fizeram foi absurdo.” Se eu não caí em prantos nesse exato momento, o fiz depois. A Adrielle foi outra pessoa que reprovou veementemente essa atitude do grupo, ela acompanhou toda minha trajetória no Grêmio. Ela me fez uma carta quando ganhamos a eleição, me parabenizando e desejando um ótimo mandato.
Envolvi-me com outra pessoa, cheguei a gostar, a ficar bastante mexida, mas, como essa mesma pessoa disse, eu era uma conquistadora – e fim. Além de eu parecer gostar de problemas. Por que eu não queria o que poderia dar certo? Por que eu só queria o difícil? Eu queria exigir plenitude das pessoas, igual a que eu estava disposta a dar.
Voltei a namorar, mesmo com esse turbilhão de coisas. Talvez tenha sido uma forma de tentar esquecer o que estava acontecendo. Fugir. Coisa que não é do meu feitio, mas essa minha atitude mostrava mais isso que qualquer outra coisa. Voltei a ser refém, de própria vontade, de um naufrágio programado.
Conseguem imaginar meu estado emocional depois desse ano na escola? Pra melhorar: ano de vestibular. Medo constante de não ser aprovada em nada. Tinha pouco contato diário com a minha mãe, e nunca fui de desabafar com ela. Teve um dia que vim chorando pra casa, pensando em chegar e pedir colo, em dizer que tudo estava péssimo, que estava morrendo de medo, que estava triste, que queria gritar quando estava lá, que só queria um abraço e ouvir um ‘Calma, filha, vai dar tudo certo’. Não fiz nada, obviamente. Cheguei tarde, peguei trânsito, e quando cheguei ela brigou por conta do horário que cheguei. Fui direto pro banheiro e tomei meu banho, chorei só. Dormi e no dia seguinte outra batalha estava à minha frente. Todo dia era uma batalha.
Compreende agora porque eu estava confusa ao mostrar o vídeo aos meus amigos? Estava dividida entre a alegria de terminar o terceiro ano, em ter conquistado alguns bons amigos pra sempre, triste e profundamente magoada com diversas outras coisas. Preferi, durante muito tempo, ignorar tudo o que tinha me acontecido e viver no que dava.
Hoje tudo parece plástico. Todos os aborrecimentos, todas as alegrias. Tudo parece tão distante que parece ser possível tocar esses momentos. Tocar com as mãos mesmo, parece palpável. Plástico, de fato.
Não tenho mais contato com a maior parte dos meus colegas e amigos do Ensino Médio, eles se vão, eu me vou. Cada um seguindo sua trilha. Ainda falo com a Barbara de vez em quando, nos vimos algumas vezes, com a Pam também. O Elvis vira e mexe falamos via orkut, a Giulia vejo sempre, ela dá aula no Cursinho que eu coordeno atualmente. A Daila me excluiu depois de um desentendimento via orkut, voltamos a falar pelo telefone, nos vimos duas ou três vezes propositalmente e não nos falamos há tempos, a Adrielle se casou e não me chamou, conversamos via e-mail depois e ficamos acordadas em não termos mais contato, foi muito dolorido durante muito tempo, mas crescer exige decisões. Por algum motivo, tudo isso aconteceu e acabou no que temos hoje. O Tweenn nunca mais falei também, o Will falamos mais algumas vezes via MSN, encontrei o Marco no Shopping esse ano, acho que perto de agosto, ele me apresentou a namorada dele e eu a minha. Ele ainda toca pagode e cursa Direito, como era o esperado. A Thaís teve a atitude mais linda que alguém que me conheceu, mesmo que de leve, poderia fazer. Mandou via correio recortes de imagens de revistas. Eu sempre fiz colagens, cartões com colagens, capa de caderno. Era mais uma terapia. Chorei ao perceber a doçura daquele ato. Fiz um presente pra ela, espero que ela goste quando receber. Uns e outros falei por orkut, e-mail e essas coisas. A Bianca me chamou pra ir a um evento esse ano, o Gian sofreu uma terrível perda, seu pai faleceu, e eu me senti péssima por não poder ajudar. O Gian é uma das melhores pessoas que já conheci na vida.
Enfim, essas são as considerações que posso tecer sobre meu Ensino Médio e o que minha memória permite lembrar e comentar. Como disse: tudo que se passou é plástico, isso não significa que seja mentira ou ficcional, mas é plástico: REAL e IMÓVEL.
Sobre a minha ex, terminamos e não mantivemos mais contato, foi essencial para o fim definitivo e para não atrapalhar meu novo (e eterno) relacionamento. Foram alguns dias antes de completarmos quatro anos. Estávamos com viagem marcada, passagens compradas, definindo só em que flat ficaríamos... O fim foi eminente depois de refletir sobre tudo o que tínhamos passado. Terminamos – terminei, e ela perguntou se era o que eu queria de fato, respondi que sim, ela aceitou – por telefone em uma segunda-feira, no sábado nos encontramos só para conversarmos como se deve e então nunca mais nos vimos. Falamos algumas vezes por MSN, orkut, telefone... mas isso foi se reduzindo mais e mais, até que nosso último contato foi feito por telefone onde ficou tudo acertado que não nos veríamos e não nos falaríamos mais. Foi o melhor a ser feito.
Refletir sobre isso é complicado. E foi muito difícil aceitar o que todos sempre me disseram: ‘ela não te ama’. (não o suficiente) Cair em mim, depois de anos me doando a um relacionamento que não geraria frutos, foi um processo gradual e lento. Mas enfim, consumado. Em quatro anos o perfil dela no orkut continuou como ‘heterossexual’ e ‘cristã’. Em quatro anos a mãe dela não soube, o pai dela não soube. Os amigos da igreja não souberam, a moça que ela considerava melhor amiga, nunca soube. Uma amiga me dizia (e ninguém precisava me dizer nada, não sou idiota, sei das coisas, principalmente da minha vida) que ela era folgada, que não era pra me levar à casa dela quando os pais não estivessem, que era pra assumir. Sempre soube que ela era covarde demais pra fazer isso, nos primeiros anos eu ainda tinha esperança, depois vi que não teria jeito, me conformei. Levei à cabo um relacionamento que nunca tinha chegado a sê-lo de verdade. Vivíamos escondidas, sempre. Mas não acho que posso culpá-la por nada: afinal, como eu já disse, não sou idiota e sempre soube e tive consciência das coisas. Por pior que seja ter de assumir que me dei sem tamanho a alguém que não me valorizou, que não me assumiu, que não se assumiu, que não me amou de verdade ou pelo menos não o suficiente para transformar o ‘amor’ em, minimamente, um relacionamento, fazer isso é necessário.
A Bi admitiu que era egoísta, que foi um erro o que tinha havido entre nós porque ela não pensou em nada, em ninguém, não pensou no pai dela, não pensou em mim, só pensou nela. Por fim, foi madura o suficiente em pouco tempo para compreender o que tinha feito e colocar as idéias no lugar. Ela nunca fez isso. Reclamava de me acompanhar até o metrô Itaquera e depois voltar pra estação em que descia, esperar o ônibus comigo até ele chegar, muitas vezes nem me buscar ou levar na portaria do condomínio em que morava, tudo por medo de alguém nos ver. Mas eu era jovem. Foi meu primeiro amor, eu queria que desse certo. Eu queria muito que tudo desse certo. Queria ser feliz; tive, obviamente, momentos de felicidade. Mas foram momentos, o contínuo era de desconforto por não poder assumir isso publicamente, não poder mostrar ao mundo o que eu era e o que eu queria – talvez isso tenha sido apenas uma vontade juvenil qualquer, mas tinha um significado pra mim: assumir significada ‘prefiro você, sou feliz e é o que eu quero’. Todos que me conheceram e conheceram a minha história nesse período sabiam da existência dela, das dificuldades, enfim. Por fim, ela nunca assumiu pra família dela, as coisas sempre permaneceram muito confortáveis pra ela, socialmente pelo menos. Espiritualmente ela devia estar totalmente dolorida. Conheço a fé cristã, conheço os preceitos e os valores e é impossível, depois que você se submete a crer, retornar. Devia ser uma luta constante, e eu compreendia – ou buscava compreender – a posição dela por isso; pela dificuldade que devia ser conseguir viver sem enlouquecer acreditando no Deus cristão e amando uma mulher, assim como ela. Conclusão: um ou outro estava errado, ou ela não me amava o suficiente, ou não amava a Deus o suficiente, ou não amava nem a mim nem a Deus, só a ela. Como saberei? Não sei, não me interessa mais saber.
Por fim, ela se envolveu com outra pessoa depois de mim, soube no nosso último contato por telefone. Sim, ela que tinha prometido não ficar com mais ninguém, prometido voltar à igreja, trilhar os caminhos na Fé... e ainda: tinha prometido não estar com mais ninguém. Foi impulsionada pela carência de carinho e atenção, segundo ela. Ela passou por um momento difícil depois que terminamos, um problema de saúde, de qualquer modo, eu não saro meus problemas de saúde e falta de carinho e atenção ficando com alguém que eu nem conheço direito, ou mais, que não considero amar. Que seja. Isso foi a ‘prova’ mais conclusiva do tempo que perdi nesse relacionamento. Incrivelmente não senti nada quando ela me disse isso, não senti raiva, ciúme ou felicidade. Nada. Surpreendi-me comigo mesma. Conversei com ela, e disse que ficaria bastante surpresa se ela resolvesse tomar alguma atitude, como assumir isso pra família, com essa nova pessoa, afinal, tínhamos passado alguns anos juntas e essa hipótese não foi levantada. No final das contas, acho que ela sempre foi muito egoísta, sempre pensou muito nela, ou muito mais nela do que em mim – que fazia exatamente o contrário.
Percebi o quanto sofri porque quis nesse tempo todo. Não sei mais nada dela. Não entro mais em orkut, twitter ou facebook. Excluímos-nos de todos esses meios. Excluímos-nos uma da vida da outra.
Com a Ta foi curioso. Quando eu quis ela não quis, depois que comecei a namorar sério, ela quis. Brigamos por e-mail porque ela foi grosseira e deu chilique. (Quem me conhece sabe que odeio chiliques) Daí soltei tudo o que tinha pra dizer. Falei tudo que estava engasgado, que eu quis, que eu corri pra que desse certo e ela desistiu, ela tinha sido covarde, tinha amarelado nos ‘cinco minutos finais do segundo tempo’. Ela tinha me prometido que daria certo, que ficaríamos juntas, que conseguiríamos... E no final? Fez como todas. Não assumiu quem era, o que queria e quem amava. Acho que esse tipo de atitude só é ruim pra própria pessoa. Não vejo positividade em negar o que se é e o que se sente. Sinceramente, acreditei que pudesse dar certo com ela. Ela tinha me feito perder o medo de tentar de novo, e no final, teve as mesmas atitudes das outras. Mas ela voltou pra igreja mesmo, se encheu de afazeres da igreja pra servir a Deus, e ser digna de Sua misericórdia pelo erro, segundo a interpretação pentecostal.
Mas ela assumiu o que fez. Tanto no lado religioso, quanto comigo. Foi extremamente sincera. Assumiu que foi covarde, que não teve peito pra lutar pelo que queria no momento, que não devia ter contado pra irmã dela – que foi totalmente contra a atitude dela. Por fim, ela disse que me amava, que me amava muito e que continuaria me amando, que ela tinha errado e perdido a oportunidade de ser feliz comigo. Achei, no mínimo, decente ela ter admitido que tinha sido fraca e que havia se arrependido. Mas o tempo já tinha se passado. Outras águas corriam pela minha vida e eu não levantei sequer a hipótese de deixar o rio em que estava navegando. Tivemos outros desentendimentos na faculdade, fruto, a meu ver, da imaturidade dela em lidar com o ‘amor que não deu certo’. Evito contato, continuarei evitando. Acho que qualquer atitude pode suscitar algo enganoso e leviano. Acho também que já falamos tudo o que tinha de ser dito.
Minha amiga Talita passou por um grande problema esse ano, não pude acompanhar diariamente todo o desenrolar dos fatos. Acho que ela não me ama mais por isso. Uma série de fatos impossibilitou meu contato contínuo com ela, mas acho que ela poderia ter me mantido informada, como tinha pedido. Enfim, espero que algum dia as coisas se arrumem. A Talita sempre foi muito importante pra mim, foi uma grande amiga, nunca deixamos de nos falar, dificilmente nos desentendíamos. Continuo amando-a como sempre. Se eu for provida de recursos para tal, ajudarei sempre no que for necessário. A Talita é um EXEMPLO. Um exemplo de coragem, de fato. De mulher, de fato. De vida, de fato. Um exemplo de até que ponto se pode chegar, mesmo com tudo contra nós.
Eu mesma não sabia como ela reagiria caso as coisas dessem errado. Ela foi excelente, marcou posição, como fez em toda sua vida. Admiro ainda mais a Talita depois disso. Sinto muitíssimo em não ter podido continuar, de fato, na vida dela. Mas as coisas tomam os rumos mais inusitados possíveis, a vida tem peças que não compreendemos. Precisamos aprender a jogar: “... Vivendo e aprendendo a jogar, nem sempre ganhando, nem sempre perdendo, mas aprendendo a jogar.” – imaginem na interpretação da amaríssima Elis.
Fiquei na coordenação do cursinho esse ano, continuarei no próximo ano. Amei. Adorei as turmas, tive alunos excelentes, excelentes também cidadãos, excelentes pessoas, excelentes jovens. Fui realizada. Para esse próximo ano, um professor de História, o Cláudio, vai seguir na coordenação comigo, porque o Guilherme não poderá ficar. Cada dia que passa percebo que maravilha será trabalhar com ele. O Cláudio é extremamente responsável e tem, de fato, fé no nosso trabalho. Condição indispensável para conseguir suportar os altos e baixos da administração pedagógica do cursinho.
E por último – e também o motivo de eu ter feito meu relicário com toda essa intensidade e tamanho – a Idealli. Por considerar que depois dela matei muitos dos monstros que me assombravam, ela é a principal responsável pela minha reflexão de hoje. Pela minha mudança e pela imensa leveza em meu ser. É alguém que me faz bem e que quero ter por toda a vida – e tenho tanta certeza que a terei pra sempre como tenho certeza que estou digitando esse texto. A música que está tocando agora na rádio e eu amo ouvir pode ser explicativa sobre essa mulher que me virou – a interpretação é de Toni Garrido, a letra do Caetano Veloso:

“...Mar sob o céu, cidade na luz.
Sonho meu, canção que eu compus
Mudou tudo, agora é você.
A minha voz que era da amplidão
Do universo, da multidão
Hoje canta só por você.
Minha mulher, meu amor, meu lugar
Antes de você chegar era tudo saudade
Meu canto mudo no ar
Faz do seu nome hoje o céu da cidade.
Lua no mar, estrelas no chão
Aos seus pés, entre as suas mãos
Tudo quer alcançar você.
Levanta o sol do meu coração
Já não vivo, nem morro em vão
Sou mais eu, porque sou você...”

Estou namorando, é público, adoro minha sogra, minha mãe a adora, temos os mesmos ideais de justiça e igualdade, o irmão dela é ótimo e nos damos muito bem. Temos os mesmos interesses por História, Sociologia, Psicologia e Psicanálise. Além de amarmos discutir sobre Política e sobre Religião. Ela me leva até o ponto e espera o ônibus comigo, vai até o metrô Itaquera sem eu pedir – e depois volta pra estação em que tem que descer, vamos à Livraria Cultura e amamos aquele ambiente, andamos pelo centro velho de São Paulo sem nenum motivo especial, ela faz pesquisas acadêmicas comigo, eu a acompanho à faculdade, ela é excelente aluna, a melhor da classe. Vamos juntas ver os melhores filmes em cartaz. Vemos peças de teatro juntas, ela apóia e dará aula no cursinho que também dou aula e coordeno. Ela torce pelo meu futuro profissional e eu pelo dela. Temos o mesmo gosto por roupas, azulejos, cores, casa, botões de camisas, sapatos, brincos, anéis, lençóis, pratos e talheres e copos. Somos incrivelmente parecidas, nas qualidades e nos defeitos, o que nos ajuda muito a crescer. A Ignês a avisou de mim, ela já sabia que eu ia chegar. Eu tinha medo de encontrá-la, sabia que ia acabar me envolvendo. Só pelo perfil, pelos gostos, pela sensibilidade clara já foi possível ver que ela era perigosa, muito perigosa. Virou minha vida de pernas pro ar, me tomou pra si, me reapresentou a mim mesma. Sou feliz, sou inteiramente realizada, em tudo. Tudo. Todas as áreas. Ela me dá amor, carinho, atenção, temos um relacionamento como sempre sonhei em ter. Ela é completa. Linda, linda mesmo. Digo a verdade. Linda e perfeita. Ela tem um corpo excepcional, um cabelo perfeito, a pele mais bem hidratada do Brasil-il-il. Ela me impulsiona a viver. Temos o mesmo gosto musical. Ela ama Blues e Jazz. Fazemos planos para nossa vida juntas desde o primeiro dia em que ficamos, acredita que passamos a noite discutindo como seria o piso da nossa casa? Sei. Loucura, mas é. Ela me visita na faculdade. Eu durmo na casa dela, ela na minha casa. Queremos nossa casa. Fazemos contratos quase diários. Sabemos das aspirações uma da outra. Respeitamo-nos. Somos íntegras e fiéis. Honramos nosso relacionamento. Nos enviamos e-mails enormes sempre. Escrevemos depoimentos. Rimos quilos. Passamos por situaões inusitadas e excessivamente engraçadas: ‘Direita, esquerda, direita’ (piada interna). Nos presenteamos com livros e filmes. Gostamos dos mesmos nomes para nossos filhos. Somos fortes. Mulheres de resistência, femininas e fortes. Corajosas, por fim. Felizes como ninguém. Críticas, cada dia mais. Inteligentes. Amamos profundamente. Queremos pra sempre. Somos pra casar. Verdadeiras e inteiras. Fazemos terapia conosco mesmo. Preferimos uma a outra, acima de qualquer coisa e de qualquer um. Amamos mais que tudo. Prestamos atenção uma na outra. Fazemos de nossa profissão uma força pra vida. Fazemos o que gostamos. Nos compadecemos pelos outros. Doamos a nós. Programamos os filmes e ambientes frequentáveis para nossos filhos. Amamos negros, admiramos sua beleza e cultura. Queremos impulsionar as origens culturais de nossos filhos. Queremos gato em casa. Somos urbanas. Amamos Av. Paulista e o ar que circula o centro de São Paulo. Temos paixão especial pelos temas históricos das grandes Guerras e ditaduras militares. Somos idealistas, pero com pés no chão. Agimos. Fazemos a revolução efetiva diariamente e seguimos: ‘Se você disser açucar, açucar, açucar, não vai adoçar o café’. Nos conhecemos com ‘Um café e um amor, quentes, por favor’. Tínhamos certeza, sempre tivemos. Queremos o mundo. Adoramos viagens, culturas diversas. Temos um Q de antropologia correndo no sangue, certeza. Não gostamos de baladas barulhentas. Preferimos um bar à meia luz com música boa. Aliás, amamos meia-luz. Temos os mesmos gostos por ambientes iluminados e as cortinas que cobrem as janelas. Queremos muito. Damos muito. Esperamos um mundo melhor. Temos vontade e vigor, fazemos. Olhamos para as mesmas coisas e pessoas. Pensamos juntas. Planejamos juntas. Executamos juntas. Conversamos muito. Choramos ao final de filmes. Preferimos drama baseados em histórias reais, nos impulsiona. Falamos no plural, não há ‘seu’ e ‘meu’, só há nosso. Somos incrivelmente irônicas e engraçadas. Jogamos os mesmos jogos. Temos postura. Temos sede de infinito. Somos um. Enfim: imagina algo mais perfeito?
Começo 2011 com uma certeza que nunca tive: do amor real e eterno. Nos encontramos.



Excelente ano novo pra todos vocês.

sábado, 25 de dezembro de 2010

Relicário 2009

Esse relicário terá formato diferente. Talvez o velho “aprendi tal coisa...” seja menos presente e as frases maiores, melhores, mais bem elaboradas ou não.

Bem, 2009 começou diferente de todos os outros anos. Estava com uma faculdade certa, a Unicsul. Matrícula feita e tudo... mas ainda estava aguardando o resultado da USP, UNIFESP e demais faculdades através do ProUni. Consegui todas, como eu previa, escolhi. Escolhi as certas, tenho certeza disso. Unicsul em História é ótimo, o curso é muito bom, os docentes são ótimos e eu, cada vez mais, quero aprender mais e desmistificar muitas coisas. Unifesp foi maravilhoso, me trouxe realização por ser uma universidade pública, federal e tudo o mais.

Amigos? Esse ano esse quesito se tornou meio nebuloso em alguns momentos. Os amigos do Ensino médio tive algumas oportunidades de revê-los, mas como era de se esperar “ano novo, vida nova”. Cada um no seu canto, cada um na sua faculdade, cada um no seu curso e em alguns momentos, reservados e restritos reservados aos velhos amigos. Foram bons os momentos de reencontro.
Na Unicsul tenho pessoas de quem gosto muito, outras simpatizo bastante, outras não.
Na Unifesp me sinto muito bem nos momentos de alegria e tal, mas sinto falta de seriedade em muitos momentos entre meus amigos e conhecidos. De certa forma, me decepcionei com a faculdade em relação às pessoas.
Na Unicsul o pessoal parece mais cordeirinhos que alunos de curso de humanas. Parece que por sermos bolsistas e a faculdade manter esse “favor” (porque é assim que parece que a maioria vê) temos que nos sujeitar, sem pestanejar, às ordens de todos. Não concordo, quase perdi a bolsa discutindo – de maneira não tão sutil e educada – sobre a disciplina online. Que fosse, que me tirassem a bolsa, tanto iria fazer. Sabe por quê? Porque eu não me importo. Eu aturo, com ou sem dor, o resultado dos meus atos.
Na Unifesp houve-se muita teoria, teoria, teoria, teoria... alunos de humanas às vezes tão de direita. Triste e um tanto quanto desmotivador para mim. Mas permaneço lá e bem. Preciso me empenhar mais, minha média global lá foi 6.5 esse último semestre, e isso não podia acontecer, porque terei que pegar bolsa do CNPq agora, pra depois de um ano, pegar a da Fapesp. Enfim... Vou recuperar minha média e espero ir melhor em 2010.

No geral, me sinto só muitas vezes por conta de amigos antigos, amigos novos. Acredito que para não se sentir só temos que nos sentir cheias de nós mesmos. Porque na verdade, somos sozinhos, nossas atitudes são individuais e a culpa que recai sobre maus passos também são só nossas.

O meu relacionamento com a Gabi terminou. Dessa vez é sério. (hahahahaha, já perdi as contas de quantas vezes repeti isso)! Ela quer voltar para a igreja – esse é sempre o motivo – mas não está, a meu ver, fazendo por onde se entregar completamente ao Senhor. E, na verdade, nem sei se ela quer mesmo isso. Ou se, por ter ficado tanto tempo longe, alcançar o Altar de Deus esteja tão longe que não se pode ouvir a voz dEle e guiar-se a partir do que Ele deseja.
Ela foi uma pessoa muito importante na minha vida. Cresci com ela. Foi com ela. Mas agora, todos os verbos que se referem a ela estão no tempo passado; exceto o amor, esse é sempre presente. Tenho lindas lembranças dos momentos com ela, e outras tristes, mas essas tristes eu nem quero lembrar. Gosto de deixar transparecer aquilo que é bom e que faz bem. Não tem como negar em nenhum momento o quanto ela representou na minha vida. Sua existência, bem como sua passagem pela minha vida é singular. Sempre soube que não ia durar, e muitas vezes fiquei de “saco cheio” dessa situação, mas não sei se o tempo ou o amor ou os dois juntos, me fizeram permanecer mais e mais ao lado dela. Ela me fez feliz, ela me amou, ela amava meu corpo, meu sorriso, meus olhos... E eu a amava tanto quanto. Foi minha mulher.

Uma pessoa especial chegou à minha vida, seu nome: Talita. Me fez acreditar de novo, e tanto... acreditar muito. Prometeu o sol, se o sol saísse... ou a chuva, se ela caísse. Me fez amar de novo e de um jeito todo especial. Uma menina linda, que está se tornando mulher, que eu admiro, que eu vejo o quanto é linda e o quanto valeu a pena. Amo-a profundamente. Por quê? Porque sim. Porque ela me conquistou, mas também me deixou. Por quem? Por Deus, oras! Sempre por Deus. Deus. E Deus. Será que vale a pena largar quem se ama por imposições religiosas? Deve valer, né?! A religião e Deus e tudo o mais nessa área são coisas que fazem parte do imaginário, e no imaginário nada tem medida, é tudo muito, é tudo extremo. Espero que a felicidade que Deus vai proporcionar a ela seja tão grande a que um dia ela pensou sentir em estar comigo. Duvido veemente, mas desejo. Eu sou especial, sou diferente, sou muito diferente da maioria das pessoas, eu me dou às pessoas, eu sou intensa, eu não me conformo com pouco e quero sempre mais. Acho que é isso, talvez, que faça com que as pessoas se encantem comigo. A Talita me acha linda e perfeita, perfeita mesmo, assim, sem defeitos. É claro que ela é doida. Estou longe de ser perfeita. Mas são coisas do amor. Ela também é toda linda, tão perfeita! Rs... Queria poder acreditar em tudo o que ela disse e queria que pudesse ser verdade. Mas não pode ser. Por quê? Porque ela não quer, porque ela decidiu que seguir a Deus é melhor. Conversamos por telefone, a mãe dela não quer que conversemos e todas aquelas coisas de pais quando descobrem algo que desagrada. Claro, a culpa é minha sob a ótica deles.
Queria que fosse difernte. Enfim...
Ela está mudando. Juro. Está crescendo, se tornando gente grande. Putz, mas dói ser gente grande hein?! Enfim... “é pesado demais carregar o mundo sozinha”, mas eu consigo, sempre consegui. Sabe... quero chegar lá na frente e poder dizer que vivi, caí, sofri, doeu, mas que amei, fui extremamente feliz, sou realizada porque a minha vida eu fiz e eu faço. Quero carregar o peso da experiência nos olhos e adquirir sabedoria todos os anos, e quero quem me admire e, principalmente, se encoraje a viver tão maravilhosamente intensamente quanto eu vivi e que tenha discernimento, força de vontade, compaixão e garra para chorar, mas poder levantar e secar as lágrimas.

Mudei. Sou uma pessoa mais dura hoje do que era no passado... aliás... acho que estou passando por uma fase que espero se encerrar esse ano: a fase do sofrimento e do crescer. Sabe quando passa a notar o que o mundo é e como as pessoas – inclusive você – são verdadeiramente? Nossa... como foi ruim. Mas estou muito feliz por outro lado: não perdi o amor. Com todas essas quedas, aprendi a levantar e tentar de novo. Espero ter força para cair e levantar o número de vezes necessário para nunca deixar de me sentir bem comigo mesma e apaixonada pelo próximo.

A Bii esse ano conversou comigo, olha só, ficamos grandinhas e conversamos! Uhuul... adorei. E sinto um amor e um carinho tão grande por ela ainda. E não é nada sexual, é sentimental. Sinto que tenho uma ligação muito forte com ela, não sei explicar. Sei que ela me faz bem, de longe mesmo.

Dei aula de Literatura no cursinho, amei. Meus alunos disseram que gostaram, eu então... Nasci pra isso, não tem jeito.

Meu irmão está lindo, cada vez mais. Quero o melhor pra ele, quero que ele consiga aprender com a experiência, que ele possa obter consciência através do meio social e tenha pensamento crítico apurado o suficiente para ser um bom homem. Minha mãe o mesmo estresse de sempre, mas está melhorando. Quero que ela seja feliz, se torne mais amável e maleável.

Quero me doar mais ao mundo. Aos outros. Mais? Claro, sempre mais... “enquanto estou viva e cheia de graça, talvez ainda faça um monte de gente feliz...” [Rita Lee]. E vou ser feliz, sou feliz. Vou fazer valer, já vale. O ano valeu, a vida está valendo. Que seja sempre assim. Que eu não perca a vontade de viver e lutar e sorrir muito, porque meu sorriso é lindo! Obrigada, amados do meu ano.



Esse ano foi mais um ano dolorido mas delicioso. Que venha 2010, estou pronta!